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quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Crédito

Num mundo cada vez mais materialista, falar de crédito logo remete a questões financeiras. Afinal, o nossso "bendito" cartão de crédito é passaporte para o desejo saciado na sociedade de consumo atual. Por outro lado, crédito pode ser entendido como sinômico de confiança. Tal qual quando selecionamos informação tendo como referência a confiabilidade da origem da fonte. Confiança, crédito! Merece crédito o modelo de democracia representativa em que vivemos? Toda vez que vejo um carro de som bradando palavras de ordem, ao contrário, sou tomado de um profundo descrédito. As "recentes" denúncias de corrupção no país, a falta de credibilidade das insitituições corroboram e aumentam o rombo em nossas almas. Por ironia o mundo funciona atualmente em função da credibilidade, sobretudo do ponto de vista econômico. Acredito que você irá me pagar, então os juros são menores, se não acredito... Em que acreditar? Nas instituições? No governo? No mercado? Em nós mesmos? Evitando colocar a discussão numa dimensão metafísica, penso que o ser humano em suas possibilidades e limitações é quem pode reverter este quadro. Podemos inspirar confiança (ou não) nas pessoas através da nossa postura, dos nossos valores. Talvez a volta do vis-à-vis, do olho no olho, da conversa...
Enfim, precisamos de novos modelos institucionais, representativos e associativos. Precisamos urgentemente de voltar a acreditar.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O ativismo digital e o peticaopublica.com.br

O mal do século XXI parece ser a informação. Deriva-se do mal do século anterior, a solidão (“Digam o que disserem, o mal do século é a solidão”, disse Renato Russo). No século passado experimentamos a (r)evolução da técnica em níveis nunca dantes alcançados. Mas ao mesmo tempo vivenciamos a solidão em meio a multidão, o blasé elevado à enésima potência. Com tantas mudanças, com tanta evolução técnica, nos isolamos em nosso pequeno universo umbilical. Atualmente continuamos solitários, mas naturalizamos a solidão e nos cercamos de ferramentas que nos possibilitam viver sozinhos, sem sofrimento, sem considerar isso um mal. Passamos a fase de ver a solidão como algo ruim. Agora achamos bom não ter laços reais com outras pessoas, assim sobra mais tempo para “tuitar”, “facebookear”, “blogar”, “googlar”, etc. Ao mesmo tempo vivemos numa época de intensas relações virtuais, de facilidade de criação de conteúdos informacionais. O volume destes conteúdos ultrapassa em muito a capacidade de processamento de nossos primitivos e limitados cérebros. Por isso, afirmo lá em cima, que a informação parece ser o mal do nosso século. O excesso dela, a facilidade com que é criada e distribuida. (Não vou entrar aqui no mérito do conceito de informação. Criamos mensagem ou informação? Ou a mensagem só se torna informação ao ser recebida e interpretada? Fica para outras discussões, mais sérias, mais acadêmicas e mais chatas).

Mesmo com esse auto-exílio (moramos no interior de nosso interior, Vander Lee!) temos desejos e demandas comuns. Do isolamento voluntário a técnica nos permite organizar manifestações e reivindicar nossos direitos. Mesmo isolados fisicamente, estamos cada vez mais próximos virtualmente. A lógica espaço-temporal foi entortada pelas tecnologias da informação.

E aqui entramos no nosso assunto: o ativismo digital. Mais específico ainda: o uso das tecnologias como ferramentas de reivindicação de direitos. E vamos falar especialmente de uma ferramenta: o peticaopublica.com.br. Está lá na apresentação do site: “O PeticaoPublica.com.br, fornece alojamento online gratuito para abaixo-assinados (petições públicas). O mesmo pretende constituir um serviço público de qualidade a todos os cidadãos brasileiros”. Qualquer pessoa pode criar um abaixo-assinado e divulga-lo através da Internet. Há, no peticaopublica.com.br, abaixo-assinados reivindicando uma infinidade de coisas: mesas de totó para centros acadêmicos, liberdade para pessoas presas, impeachment de políticos, mudanças na legislação, o fim do voto obrigatório, construção de creches, hospitais, etc. Certamente uma parte considerável das reivindicações feitas no site são referentes a questões pontuais: algumas até parecem brincadeira. Mas existem reivindicações abrangentes, de interesse de toda sociedade, ou de grande parte dela.

O ativismo político, turbinado pelas tecnologias da informação e da comunicação, permite que possamos cobrar de forma ampla a observância de direitos fundamentais, garantidos pela Constituição. Embora seja menos eficiente, no meu ponto de vista, que a manifestação concreta, a manifestação virtual tem a vantagem de alcançar mais pessoas e cobrir uma área geográfica muito maior (teoricamente pode ser o mundo inteiro).

O que me motivou a escrever essas linhas foi um projeto de iniciativa popular que propõe alterações na Lei 9.503/97, que institui o Código de Trânsito Brasileiro. A legislação brasileira permite que o cidadão possa apresentar projetos de lei à Câmara dos Deputados, diretamente, sem a intermediação de um parlamentar (ver Art. 252 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados). O Art. 14 da Constituição Brasileira diz que “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: plebiscito, referendo e iniciativa popular”. No Art. 61 estão definidos os atores que podem apresentar projetos de leis: “a iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição”; e também estão colocadas as regras para a apresentação de projetos de lei de iniciativa popular (no § 2º): “A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles”.

É aqui que a tecnologia faz a diferença no ativismo. O alcance destas iniciativas é muito maior com o uso das ferramentas de comunicação atuais. O abaixo-assinado que me motivou a escrever este texto propõe, basicamente, a alteração das penas (aumento da rigidez) para quem dirige embriagado. Se fosse utilizar meios convencionais, anteriores à rede seria mais difícil para o autor desta petição conseguir a quantidade de assinaturas necessárias para que seu projeto fosse analisado pela Câmara dos Deputados. Possivelmente a proposta nem existiria. Porque seria necessário dispor de tempo e dinheiro para levá-la adiante. Com o uso da rede e das tecnologias, essa coleta de assinaturas é um trabalho rápido e barato. Tal qual a disseminação da informação sobre o projeto.

Através das tecnologias da informação e da comunicação, o cidadão exerce seu direito constitucional de manifestação e participação. Neste sentido o peticaopublica.com.br cumpre seu objetivo, implícito lá em sua apresentação, de ser uma ferramenta de exercício da cidadania. Finalizo esclarecendo que esta é minha forma de ver o serviço oferecido pelo site. Considero-o antes de tudo uma ferramenta importante de exercício da cidadania, um meio de reivindicar direitos. E, porque não, um eficiente serviço de informação.